**FONTE *- Lionel Zaclis e Daniel Kalansky - Advogados especializados em mercado de capitais do escritório
Barretto Ferreira, Kujawski, Brancher e Gonçalves Sociedade de Advogados
O acesso ao mercado de capitais mostra-se uma alternativa cada vez mais importante no
cenário da economia brasileira, uma vez que pode oferecer formas de captação de
recursos e de financiamento com opções mais atrativas que as demais modalidades
existentes no mercado.
Atualmente, temos visto no Brasil uma evolução no financiamento ao setor imobiliário,
com intensa utilização do processo de securitização de recebíveis imobiliários e emissão
dos Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs). A Lei 9.514, de 20 de novembro de
1997, que instituiu o Sistema de Financiamento Imobiliário, incentivou a criação de um
mercado secundário de créditos imobiliários, por meio da disciplina da securitização
destes créditos, iniciando uma nova e importante fase do financiamento destinado a esse
importante setor da economia nacional.
A expressão "recebíveis imobiliários", usualmente empregada no mercado financeiro,
corresponde aos créditos imobiliários das entidades financiadoras, junto a pessoas físicas
ou jurídicas, mutuarias dos empréstimos que lhes tenham sido concedidos para aquisição
ou produção de imóveis, sujeitos ao processo de securitização.
Não é propósito deste artigo discorrer sobre todos os aspectos jurídicos envolvidos na
securitização de recebíveis imobiliários e na emissão de CRIs, mas, sim, abordar, ainda
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que resumidamente, alguns tópicos relativos ao lastro para emissão de CRIs,
especificamente aquele que diz respeito à estruturação da operação built-to-suit,
comparando (a) a alternativa da locação com (b) a da concessão de direito real de
superfície.
A locação na operação built-to-suit pode ser entendida como um contrato pelo qual o
locador implementa o empreendimento imobiliário no interesse do locatário, que, por
sua vez, passa a utilizá-lo por um determinado período, garantindo ao primeiro o retorno
dos investimentos realizados no projeto e a remuneração pelo uso do imóvel.
A operação built-to-suit possibilita às empresas utilizar o empreendimento imobiliário
desenvolvido de acordo com as suas necessidades, sem a necessidade de adquirir imóveis,
imobilizando alto volume de capital.
Os créditos oriundos deste contrato são sujeitos a securitização, permitindo que o
locador antecipe sua saída do negócio, mediante a cessão dos mencionados créditos,
lastreados nos aluguéis, a uma companhia securitizadora que emitirá os CRIs e os
distribuirá aos investidores.
Tem-se alertado que a operação built-to-suit veiculada por meio de locação envolveria
considerável risco jurídico, consistente na possibilidade de a Justiça aplicar a disciplina da
Lei 8.245/91, e, em conseqüência, facultar à locatária, seja a rescisão antecipada do
contrato, sem o pagamento do total do preço, seja a revisão do aluguel para ajustá-lo às
condições do mercado.
De nossa parte, entendemos ser extremamente remota a viabilidade de acolhimento
judicial de pretensões naquele sentido, na medida em que as características específicas das
relações jurídicas subjacentes em uma operação built-to-suit afastam por completo a
incidência da Lei 8.245/91. Com efeito, embora o arcabouço contratual que envolve a
operação em tela contemple, também, um contrato de locação, esta, no caso, não pode
ser encarada de modo autônomo, desligada do todo negocial. A interpretação da lei não
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pode se resumir à sua hermenêutica literal, devendo levar em conta, sobretudo, o seu
aspecto teleológico.
Isso não bastasse, é inteiramente aplicável à hipótese a norma inserta no parágrafo único
do artigo 473 do Código Civil, a qual estabelece que, se uma das partes houver feito
investimentos consideráveis para a execução do contrato, a denúncia unilateral pela outra
parte só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e vulto
dos investimentos realizados.
Sem embargo disso, considerando-se que, embora diminuto, não é totalmente
desprezível o risco legal acima mencionado, deve ser considerada a possibilidade de
utilizar-se a concessão de direito real de superfície (CODIRS) como alternativa à
operação built-to-suit via locação.
De acordo com o disposto nos artigos 1.369 e seguintes do Código Civil e na Lei
10.257/2001, a CODIRS consiste no instituto mediante o qual o proprietário concede a
outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno, utilizando-o por tempo
determinado e mediante preço certo.
Na operação built-to- suit via CODIRS, uma empresa interessada em utilizar uma
edificação adequada às suas necessidades torna-se titular do direito real de uso do terreno
correspondente, por prazo determinado e mediante preço certo, pagável em prestações,
contratando, paralelamente, a construção do mencionado prédio. O valor a ser pago pela
superficiária corresponde ao crédito imobiliário sujeito a securitização, por meio de
emissão de CRIs.
A utilização da concessão do direito real de superfície, nas operações built-to-suit pode
servir como alternativa à locação, uma vez que o preço é certo e fechado, sendo
legalmente vedado à superficiária rescindir o contrato mediante o pagamento de
indenização inferior ao preço, ou pleitear a revisão do preço acordado.
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A escolha da alternativa mais apropriada dependerá, naturalmente, das características e
peculiaridades do negócio pretendido, o qual deverá ser analisado e estruturado com o
máximo cuidado, devendo ser levados em conta, ademais, os aspectos tributários
envolvidos na operação.
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